O Hawaí, seja aqui / Tudo o que sonhares / Todos os lugares / As ondas dos mares
Pois quando eu te vejo / Eu desejo o teu desejo…
Pois quando eu te vejo / Eu desejo o teu desejo…
Os versos acima fazem parte da canção “Menino do Rio”, composta por Caetano Veloso em resposta à “encomenda” feita por sua amiga Baby Consuelo, que lhe pediu uma música para um cara que ela achava bonito, o Peti, um surfista que circulava em Ipanema da época. Baby gravou a música para o seu álbum “Pra enlouquecer” e Caetano aproveitou para inserir a sua própria versão no álbum “Cinema Transcendental”, ambos lançados em 1979.
Mas foi
somente em fevereiro de 1980 que a música estourou, quando a versão de
Baby foi aproveitada para ilustrar a abertura da nova novela das oito da
TV Globo: Água Viva.
Download da Trilha: http://www.4shared.com/rar/WDdvyw3G/Trilha_Sonora_da_Novela_-_Agua.html
Água Viva reforçou o status da locação em primeiro plano da zona sul carioca, com destaque para uma geografia harmoniosa ao sabor da brisa (e das tormentas) das relações humanas. Os hábitos e modismos lançados pela novela tiveram os esportes marítimos como suporte, principalmente o windsurf,
icônico na sua abertura, criada pela equipe de Hans Donner. E foi um
grande sucesso, que “grudou” do primeiro ao último capítulo.
Todo este vento a favor serviu para potencializar a utilização das músicas nas cenas da novela e promover a sua trilha sonora, que vendeu muito naquele ano. Curiosamente, foi uma das últimas trilhas a “ostentar” o título de “trilha sonora original” na capa. Em breve o termo “nacional” seria aplicado aos discos, visto que já era praxe na Som Livre
a pesquisa e a seleção de repertório serem realizadas diretamente nas
gravadoras. E adivinha o quê? Um desses pesquisadores era um certo
alguém que assinava como Lulu dos Santos, aquele mesmo,
cujo destino foi ser ‘star’. E estrelas não faltaram na sua seleção
para a trilha da ensolarada novela de Gilberto Braga.
Das 12 faixas que compõem o disco, 8 são interpretações femininas, um claro indicativo da evolução do papel da mulher na teledramaturgia nacional, que teve início no final da década de 70 com a série Malu Mulher e com novelas “pra frentex”, como a já citada Dancin’ Days. Progressivamente, as novas heroínas passaram a dominar o horário das oito (posição antes reservada aos românticos marmanjões) e tiveram seus conflitos afinados com as mudanças de comportamento que a nova década trazia. Nada de velhas mocinhas choronas, sofridas e subjugadas. O que se via eram mulheres fortes, independentes, ambiciosas, “lançadoras” de moda.
“Grito de Alerta”,
composição de Gonzaguinha interpretada por Maria Bethânia, modulava os
dramas passionais de Lígia, personagem de Betty Faria, que ainda contou
com o lamento resignado de “Altos e Baixos”, de Suely
Costa e Aldir Blanc, na interpretação de Elis Regina. Já as estripulias
da milionária falida Stella Simpson, inesquecível caracterização de
Tonia Carrero, eram acompanhadas pelo chorinho “Noites Cariocas”,
música de Jacob do Bandolim, que ganhou letra de Hermínio Bello de
Carvalho e um arranjo moderno para a interpretação de Gal Costa, que
vivia a sua fase “Gal Tropical”. “Desesperar Jamais”,
de Ivan Lins e Vitor Martins, na voz de Simone, marcou a luta da
obstinada Suely, importante papel de Ângela Leal, uma assistente social
que cuidava de Maria Helena (Isabela Garcia), a criança órfã que unia
vários núcleos da trama. A diva Elizeth Cardoso ressurgia com “No tempo dos quintais”, manifesto nostálgico de Sivuca que contrastava um bocadinho com as modernidades da novela. Da mesma forma que “Peito Vazio”, genial composição de Cartola, interpretada aqui, veja só, por Lucinha Araújo, mãe de Cazuza. “Amor meu grande amor”
foi o tema da jovem Sandra, vivida por Glória Pires, em contínua
ascensão na carreira, assim como Ângela Ro Ro, intérprete deste blues
refinado, escrito em parceria com Ana Terra e regravado pelo Barão
Vermelho anos depois.
Além de
Glória Pires, outros dois jovens atores viviam a sua escalada rumo ao
protagonismo em futuras novelas. Kadu Moliterno, o fotógrafo Bruno,
disputava o amor de Janete (Lucélia Santos) com o jovem médico Marcos,
vivido por Fábio Jr. Ambos tiveram temas marcantes. O primeiro com “Realce”,
canção recém-lançada no disco de mesmo nome do cantor e compositor
Gilberto Gil. Abre o lado B da trilha e resume toda a estética hedonista
deste princípio de década e que Água Viva soube expor com vivacidade.
Já o segundo, assumia enfim a sua identidade brasileira, após uma ameaça
de ostracismo como Mark Davis. Fábio Jr. cantava o próprio tema, “20 e poucos anos”, num arranjo chique e espontâneo para este hino juvenil. Há ainda a inserção muito apropriada dos clássicos náuticos “Wave” (Tom Jobim) e “Cais” (MIlton Nascimento e Ronaldo Bastos), que impulsionavam as paixões à beira-mar do personagem Nelson (Reginaldo Faria), um bon-vivant
falido, campeão de pesca que disputava o amor de Lígia com seu irmão
Miguel Fragonard, um cirurgião plástico de renome, primeiro papel de
Raul Cortez na TV Globo.
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